Doria foi vítima da máquina de moer reputações dos bolsonaristas, diz marqueteiro de tucano
Lula Guimarães diz, no entanto, que exaustão da polarização pode abrir espaço para ex-governador
Por: Redação
02/05/2022 às 11h32Atualizada em 02/05/2022 às 11h35
Publicitário da campanha presidencial de João Doria (PSDB), Lula Guimarães, 54, diz que seu cliente ainda não decolou nas pesquisas por ter sido vítima da "máquina de moer reputações" bolsonarista.
Publicitário da campanha presidencial de João Doria (PSDB), Lula Guimarães, 54, diz que seu cliente ainda não decolou nas pesquisas por ter sido vítima da "máquina de moer reputações" bolsonarista.
Ele enxerga, no entanto, uma janela de oportunidade para o crescimento de uma terceira via, em razão do que considera ser uma certa fadiga da população com o cenário de polarização entre Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL).
"A exaustão da polarização pode ser a mola para que os candidatos da terceira via possam significar alguma esperança", afirma, em entrevista à Folha.
Na última terça-feira (26), começaram a ir ao ar as primeiras inserções de TV do PSDB, que mostram Doria como uma alternativa de centro e alguém com a marca da competência, que devem ser os dois principais motes da pré-campanha do ex-governador.
Veterano de campanhas tucanas, Guimarães trabalhou com o próprio Doria na vitoriosa eleição para a Prefeitura de São Paulo em 2016. Em suas peças publicitárias reside a maior esperança do candidato de ganhar pontos que permitam que seu projeto sobreviva aos questionamentos dentro do próprio partido.
O publicitário afirma também que Bolsonaro e Lula são equivalentes na falta de eficiência econômica, mas diferentes na política.
ENTREVISTA
Como cavar um espaço para a terceira via em um cenário tão polarizado?
Tenho acompanhado várias pesquisas. Estamos chegando numa exaustão da polarização, um teto máximo de Lula e Bolsonaro. Os dois não tendo mais para onde crescer, começa a bater um certo desespero de as pessoas acharem que vão ter que optar pelo menos pior. E há um contingente grande que acha que não precisa escolher o menos pior, especialmente porque a eleição tem dois turnos.
Em 2018, candidatos com história política consistente foram vítimas da polarização e acabaram tendo uma votação muito pequena. Isso não pode acontecer agora?
O mesmo fenômeno aconteceu em 2016, com João Doria. Ele venceu no primeiro turno para prefeito por conta de um crescimento na reta de chegada do Fernando Haddad, que esvaziou as candidaturas de Celso Russomanno e Marta Suplicy.
Também ocorreu com Bolsonaro em 2018. Mas é um movimento de véspera de eleição. Existe um percentual expressivo do voto nem-nem, nem Lula nem Bolsonaro.
O João não foi descoberto ainda por esse eleitorado muito porque a rejeição dele cresceu rápido. E não por uma má avaliação da gestão e do seu trabalho. A máquina bolsonarista fez um trabalho de moer a reputação dele, depois da pandemia especialmente. Existe um domínio do bolsonarismo nas redes sociais. Eu acompanho pesquisa qualitativa no Nordeste. Você tem no interior da Paraíba, do Piauí, eleitores que rejeitam o Doria, mas nem ouviram falar dele. Esses eleitores foram operados, receberam informação dessa máquina.
Grudou na imagem de Doria que ele é artificial, marqueteiro. O estilo dele não contribui para essa visão negativa também?
Veja que você não citou nenhum caso de corrupção, negacionismo, nada que pudesse desqualificar o João do ponto de vista da gestão. Os atributos negativos são ligados à pessoa dele, ao excesso de marquetismo, de organização, às vezes vaidade pessoal. É mais fácil reverter rejeição pessoal do que por um escândalo de corrupção, nepotismo ou indulto a um cara que foi condenado pelo STF.
Como o sr. pretende trabalhar essa questão da imagem, então?
Eu tenho a expectativa de que ele consiga mostrar, na comunicação, a sua competência de gestão, seu método, sua organização, as coisas positivas que até os adversários reconhecem. O João montou em São Paulo um secretariado que é de ministério, só tinha craque. É um cara que vai dormir às 2h e acorda às 5h. Tem obsessão por organização. Esses atributos vão ser facilmente percebidos se a gente fizer uma comunicação que possa mostrá-lo sem que seja no cargo de governador tendo que dar as más notícias da pandemia. Nos últimos dois anos, foi lockdown, restrições. Claro que trouxe a boa notícia da vacina.
A acusação que é feita é que ele marqueteou demais a vacina.
O Bolsonaro falou contra a vacina e o João falou a favor. É muito difícil alguém que faz o esforço que ele fez, de cruzar o mundo para fazer um acordo com uma empresa privada, para trazer a vacina o mais rápido possível, não querer usar isso a favor da sua própria imagem.
Como o sr. compara essa eleição com a de 2018?
Em 2018 a gente ainda colheu o resultado dos movimentos de 2013, dos protestos e da insatisfação das pessoas com a política. Em 2016 a gente vê, até na própria eleição do João Doria, um outsider. E depois o auge, que é a eleição do Bolsonaro. Tenho a impressão que em 2018, se o candidato não fosse o Alckmin, fosse talvez o João, representaria melhor esse anseio do outsider. E talvez o espaço do Bolsonaro tivesse sido reduzido. Tivemos ainda um episódio que foi um divisor de águas, que foi a facada. Agora a gente não tem mais esse outsider, tem uma eleição em que as pessoas estão a fim de alguém experiente.
Qual o impacto para Bolsonaro de todo o dinheiro que ele está despejando na economia, como o Auxílio Brasil e outras medidas?
O que eu tenho visto nas pesquisas é que os cidadãos que são impactados pelo Auxílio Brasil não transformam isso em voto. Acham que o Lula vai melhorar e aumentar. O Bolsa Família tem um poder grande na sociedade, é um programa fundamental do avanço da pobreza para a classe média para 35 milhões de pessoas. É uma marca muito grande ainda do PT, que o João entende que tem de continuar.
Em 2016, o slogan de Doria foi "não sou um político, sou um gestor". Ainda dá para trabalhar esse conceito hoje?
Dá para dizer que ele é um político gestor. Tem a experiência da política, mas não abandona uma boa gestão. O que prova isso são os números de São Paulo, um estado que cresceu cinco vezes mais do que o Brasil, gerou um terço dos empregos no país. Você pode acusá-lo de usar calça apertada, almofadinha, mas isso não apaga os resultados.
E o BolsoDoria, até que ponto ainda assombra a imagem dele?
O BolsoDoria foi um movimento muito mais de uma militância que ele depois abraçou. Assim como o João, dezenas de milhões de brasileiros se decepcionaram com o Bolsonaro. Esperavam um governo que teria uma condução da economia mais eficiente, mais privatizações, e viram um certo despreparo, inexperiência ao lidar com os problemas nacionais.
A ideia é tratar Lula e Bolsonaro como dois polos equivalentes? Ou há uma diferenciação a ser feita?
Eles têm resultados para o Brasil que são equivalentes. O Lula fez um governo de grandes avanços, mas depois o PT promoveu grandes declínios, especialmente o governo Dilma. O Bolsonaro já se mostrou um governo que foi ineficiente. Agora, do ponto de vista político, não dá para colocar Lula e Bolsonaro no mesmo patamar. O Lula, apesar de todas as acusações que podem ser feitas, nunca demonstrou vontade de fazer um atentado contra a democracia. Não disputou um terceiro mandato quando podia ter feito um movimento golpista. A Dilma nunca fez um indulto para soltar o Lula ou qualquer preso.
Até que ponto a divisão no PSDB atrapalha seu trabalho?
O PSDB sempre teve conflito. O PT também. Vai caindo a ficha para o PSDB de que é necessário ter candidato a presidente, porque esse grande palanque que a propaganda eleitoral dá é importante para reconstruir alguns valores do partido. E o PSDB tem pilares importantes que às vezes são esquecidos. Quem tem 20 e poucos anos não sabe dos avanços do governo FHC, nem que a Lei de Responsabilidade Fiscal é uma conquista do PSDB, que o próprio Bolsa Família vem do programa Bolsa Escola, criado pelo partido.
Em São Paulo, Rodrigo Garcia tem buscado um certo descolamento de Doria. Como lidar com isso?
Pode existir uma intenção dos adversários de dizer que o Rodrigo quer se descolar do João. Mas o Rodrigo estava presente no governo o tempo inteiro. Acho pouco possível desassociar. E acho que pode ser muito positivo para ele mostrar os resultados do João.
Existe uma pressão para que Doria escale alguns degraus na pesquisa rapidamente, até para que a candidatura sobreviva. Como é trabalhar nesse ambiente?
A pressão sobre a comunicação sempre existe. A equipe que o João já traz é muito capaz, de craques. Chego para somar num time muito bom. Comunicação tem de fato um poder, mas é limitado. A política está acima. A gente vai ter agora, nas inserções ou na chegada da propaganda eleitoral, uma oportunidade de fazer com que o João cresça. A exaustão da polarização pode ser a mola para que os candidatos da terceira via possam significar alguma esperança.
RAIO-X
Lula Guimarães, 54
É graduado em jornalismo pela PUC-SP. Suas principais campanhas eleitorais foram Eduardo Campos e Marina Silva (2014), João Doria (2016) e Geraldo Alckmin (2018)
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