Na semana em que completou 70 dias no cargo, o governador Rodrigo Garcia (PSDB-SP) enfrentou seu primeiro teste político mantendo a discrição que vem angustiando alguns de seus aliados, temerosos acerca de seu desempenho na busca pela reeleição em outubro.
A crise veio por duas frentes, ambas oriundas de Brasília. Primeiro, o presidente Jair Bolsonaro (PL) tentou jogar na conta dos estados o ônus político do aumento dos combustíveis, insumo eleitoral de alta toxicidade.
Após uma ida a Brasília para discutir o projeto do governo que limitaria a cobrança do ICMS (principal imposto estadual) com outros governadores e o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), o tucano viu um texto com compensações aos estados ser costurado sem precisar subir demais o tom contra o Planalto.
Segundo, o apoio aprovado no PSDB à candidatura de Simone Tebet (MDB-MS) ao Planalto resultou em um blefe público dos aliados União Brasil e Progressistas, que ameaçam deixar a ampla coligação montada por Rodrigo em São Paulo.
Na mesma quarta (8) em que visitou o xará senador, Rodrigo encontrou-se com o presidente e presidenciável do União, Luciano Bivar, e com o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Ali, todos pareciam firmes no seu apoio ao paulista. No dia seguinte, ambos os caciques falaram em desembarcar da postulação de Rodrigo, insinuando no caso de Bivar apoio a Fernando Haddad (PT) e no de Lira, ao nome de Bolsonaro na disputa, o ex-ministro Tarcísio de Freitas (Republicanos).
Bivar quer manter o espaço de seu partido em São Paulo e reservar a vaga de senador na chapa de Rodrigo, um posto que será definido na última hora dada as condições obscuras da disputa. Já Lira reclama do acordo do PSDB alagoano com Renan Calheiros (MDB) contra seu grupo, mas o fato é que Rodrigo já amarrou o Progressistas ao ceder a suculenta Secretaria de Transportes Metropolitanos à sigla.
Enquanto o show seguia, telefonemas reiteravam compromissos. Publicamente, nem uma palavra do governador, fiel a um estilo que lembra mais do de Geraldo Alckmin, que governou São Paulo como tucano por quatro mandatos e hoje é o vice da chapa de Luiz Inácio Lula da Silva pelo PSB.
Há algumas diferenças. O proverbial silêncio beneditino de Alckmin é compartilhado por Rodrigo, assim como sua aversão a excesso de exposição. Mas a década dos 2010, passada pelo governador em Brasília, lhe deu um traquejo de articulação que não se via no Bandeirantes do antecessor.
Rodrigo e Lira, por exemplo, estão na mesma fotografia como deputados estreantes em 2011, e o tucano costuma aconselhá-lo —sem holofotes, como ocorreu na quarta. Um de seus principais interlocutores é o ex-presidente da Câmara Rodrigo Maia, também um egresso do DEM (hoje União) que virou tucano.
É o oposto do estilo de João Doria (PSDB), que deixou o cargo em 31 de março após ameaçar ficar na cadeira por temer não ter apoio real na sigla para tentar Presidência —o que gerou uma rebelião do grupo de seu então vice, Rodrigo. A profecia se realizou e a candidatura, isolada no PSDB, implodiu no dia 23 de maio.
Em vez das ritualizadas reuniões de secretariado às segundas no Palácio dos Bandeirantes, agora o gabinete se desloca para pontos do estado neste dia e às sextas. Das 22 regiões administrativas, 17 já foram visitadas, cobrindo a lacuna deixada por Doria no contato com prefeitos e lideranças locais —de quebra, apresentando Rodrigo a multiplicadores eleitorais.
Internamente, o governador fez gestos ao antecessor e a grupos tucanos, que o veem como um intruso no ninho. Aliados do governador ganharam cargos, como Antonio Imbassahy (alocado na agência InvestSP) e Marco Vinholi (agora no Sesi), assim como nomes ligados à velha guarda tucana, como Hubert Alqueres (Educação) e Felipe Salto (Fazenda).
Enquanto isso, Rodrigo fez mudanças de cunho próprio, como na troca da chefia das polícias. Conseguiu refrear o início de crise na segurança, colocada nas suas primeiras semanas no cargo, com a mudança e com as ações coordenadas com a prefeitura paulistana contra roubos por falsos entregadores de aplicativos.
Mais importante, pagou bônus a policiais. Segundo integrantes da área de segurança estadual, isso ajudou a desmontar em parte o bolsonarismo do setor, até por comparação: as promessas de aumento do presidente às categorias federais caíram no vazio. E Rodrigo ensaiou um discurso mais duro contra o crime, em consonância com o conservadorismo geral do eleitorado.
É um componente a mais na disputa com Tarcísio, visto no Bandeirantes como o adversário a ser batido no primeiro turno,visando a finalíssima contra Haddad. Na quinta (9), integrantes do time de Rodrigo comemoravam a pesquisa Exame/Ideia na qual ele superava os dois dígitos e empatava tecnicamente com o ex-ministro e com o ex-governador Márcio França (PSB), estes algo à frente.
França tem se vendido como o "wild card"
, a peça que pode levar o pleito para um lado ou para outro. Hoje sua permanência no páreo é estimulada pelo PT,
que o vê segurando o crescimento de Rodrigo. O PSDB aposta que o "recall" do pessebista irá evaporar.
Ambos os lados concordam, apesar da insistência de França em se dizer candidato, que ao fim ele deverá sair para o Senado —restando saber em qual chapa. É equação complexa, que passa pela esperada desistência do apresentador José Luiz Datena (PSC), que está na chapa de Tarcísio.
O plano de voo tucano seguirá na semana que vem, com a indicação da senadora Mara Gabrilli (PSDB-SP) ao comando de seu programa de governo, com o apoio de Bruno Caetano, ex-secretário paulistano de Educação e diretor-executivo da estadual Fundação Seade.
A primeira etapa de propaganda, com as inserções partidárias, foi vista como bem-sucedida para apresentá-lo e estabelecer que ele não está nem com Lula, nem com Bolsonaro. Há votos para pescar no lago de Haddad e França, avaliam os estrategistas de Rodrigo, mas o governador mantém a determinação de não se colocar ostensivamente na corrida agora.
Isso tem levado à ansiedade entre aliados que temem que a postura seja vista como timidez excessiva ou, pior, soberba pelo eleitorado. Um tucano com larga quilometragem diz que o PSDB está errando ao considerar essa uma disputa como as usuais das últimas décadas, que acabavam no embate com o PT.
A pulverização de votos na centro-direita, argumenta, traz um risco real de o partido não chegar ao segundo turno, e assim seria importante na sua visão votar o time em campo já. A resposta por ora, contudo, é de que nada muda e que 10% de intenções seria um patamar satisfatório para o tucano largar a campanha de TV em agosto.