O coordenador do grupo de trabalho da Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) sobre reforma tributária, senador Efraim Filho (União-PB), entregou nesta quinta-feira (19) sugestões ao relator da PEC 45/2019 na Casa, o senador Eduardo Braga (MDB-AM). A reunião no colegiado consolidou as conclusões sobre o tema após uma série de sete audiências públicas e finalizou os trabalhos do grupo criado para estudar o Sistema Tributário Nacional.
Efraim explicou que o trabalho deu ênfase a aspectos técnicos da discussão, sugerindo emendas à PEC que atenderiam as sugestões do grupo. Ele afirmou que a reforma é complexa, mas trará bons resultados ao país.
— Não existe nada parecido no mundo. A Índia e o Canadá são o que mais se aproxima, mas não tem essa complexidade. Todas as preocupações dos 53 expositores [das audiências públicas feitas pela comissão] estão trazidas, tudo o que foi dito a favor ou contra consta no relatório. Mas o GT fez uma decisão de optar pelo critério técnico. Meu sonho é ver essa reforma tributária aprovada, e que não seja uma para resolver a vida dos governos: deve ser vista pelo olhar do cidadão, do empreendedor, do contribuinte.
O grupo foi criado em junho pelo presidente da CAE , o senador Vanderlan Cardoso (PSD-GO), para instruir o relatório de Braga na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde tramita a proposta. A previsão é que o relatório seja oficialmente disponibilizado em 24 de outubro .
Para o relator, a reforma tributária pode ser o maior legado que esta legislatura no Congresso Nacional pode entregar ao Brasil. A PEC busca transformar cinco tributos (ICMS, ISS, IPI, PIS e Cofins) em três: o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS) e o Imposto Seletivo. Cada novo tributo terá um período de transição.
Entre as sugestões apresentadas, Efraim propôs preservar o federalismo na atuação do Conselho Federativo, que será criado para gerir e distribuir o IBS entre os entes da Federação. O IBS substituirá o ICMS (estadual) e o ISS (municipal), e será recolhido de modo unificado ante o Conselho. Apesar de a entidade ser composta apenas por representantes de estados e municípios, Efraim sugeriu limitar a participação da União no seu funcionamento.
— Uma grande preocupação é exatamente a participação da União. Ela não participa do Conselho, mas em determinados momentos terá, de forma extraordinária, que estar presente principalmente quando for para uniformizar a linha de ação. A sugestão é que [haja] uma participação [da União] em caráter extraordinário apenas nas matérias que sejam comuns.
A senadora Professora Dorinha Seabra (União-TO) questionou a necessidade da criação da entidade e sua atribuição de "legislar". Eduardo Braga afirmou que essa será uma das principais mudanças no seu relatório. Ele indicou que mudará o nome para “Comitê Gestor” e simplificará sua atuação.
— [Será] um comitêsimples, que fará com que o sistema tributário funcione sem complicações políticas… O comitê gestor terá funções administrativas e gestoras. As questões federativas competirão à Casa da Federação [se referindo ao Senado Federal], como já pressupõe a Constituição Federal— disse.
Na avaliação de Efraim, são necessários mais estudos para prever os casos em que caberá à Justiça federal ou estadual julgar as divergências sobre os novos impostos. Segundo ele, o atual texto pode levar a confusão quanto à competência jurisdicional.
Efraim defendeu o esclarecimento de uma das principais novidades da reforma: o princípio da não cumulatividade do imposto. A CBS e o IBS são formas de Imposto sobre o Valor Agregado (IVA), que tributa apenas as etapas do comércio que geram novo valor ao produto ou serviço, sem incluir no cálculo um tributo já pago em uma operação anterior. Por isso é chamado de não cumulativo.
Mas, para Efraim, o trecho da atual proposta que condiciona a compensação “à verificação do efetivo recolhimento” gera dúvida. Na opinião dele, o texto deve deixar claro que, caso um imposto já tenha sido pago em fase anterior do processo produtivo, o contribuinte será automaticamente compensado.
—A leitura causou muita confusão. Se chegou a ter ideia generalizada que o contribuinte seria um “fiscal do imposto”, porque lá no texto teria algo que [o contribuinte] só receberia os créditos se o antecessor na cadeia [de produção] também tivesse pago. A regra geral é: assegura-se a imediata compensação do imposto incidente nas etapas anteriores.
Outra vantagem do IVA, segundo Efraim, é a possibilidade de identificar exatamente o valor dos impostos que o contribuinte desembolsa em um produto. Com isso, ele apontou a obrigação de as notas fiscais identificarem os impostos pagos como um avanço na transparência pública.
As regras sobre a distribuição do IBS pelo Conselho Federativo aos estados e municípios terão uma longa transição de 50 anos (de 2029 a 2078). A data tem sido questionada por parlamentares, como Efraim e o senador Izalci Lucas (PSDB-DF), que propõem mudança para 30 anos de duração.
Após a reunião na CAE, Braga afirmou em coletiva de imprensa que não mudará o prazo. Segundo ele, “existem estados que não suportariam essa redução”.
Na segunda audiência pública promovida no âmbito do grupo de trabalho , em agosto, os convidados chamaram a atenção para a dificuldade de prever se a PEC gerará aumento ou diminuição de carga tributária. Efraim propôs na reunião que a proposta já preveja limites ao Estado no poder de tributar, de modo a prevenir a majoração de impostos:
— [Sugerimos] a possibilidade de estipular um teto máximo com percentagem de alíquota máxima ou [percentagem do] PIB.
A PEC também permite criação do Imposto Seletivo por medida provisória logo que for promulgada. Sua função será tributar produtos e serviços nocivos ao meio ambiente e à saúde — hoje papel do IPI, que será extinto. Mas, segundo Efraim, o Senado deve especificar no texto as situações em que o imposto será utilizado e deve garantir a não cumulatividade, ou seja, que o imposto incida "sobre o produto apenas uma vez”.
— [O texto sobre o Imposto Seletivo]veio de forma muito abrangente, como um polvo com tentáculos podendo chegar a tudo e a todos. A insegurança jurídica prejudica a qualidade dos investimentos. A opção foi aperfeiçoar para que tenhamos um texto que reforce o caráter extrafiscal. [O Imposto Seletivo] não deve ter função arrecadatória, tem função regulatória.
Para Braga, a PEC mudará permanentemente a dinâmica da economia nacional. Segundo ele, as regiões buscam desenvolver-se principalmente por meio de incentivos fiscais, como a redução de impostos estaduais, atraindo a atividade econômica para gerar desenvolvimento. Como o IBS será gerido pelo Conselho Federativo, governadores e prefeitos têm acusado o texto de diminuir a autonomia desses entes inclusive para buscar esses investimentos. Para contornar o problema, Braga busca valorizar o Fundo de Desenvolvimento Regional (FDR) a ser criado pela PEC, que será o responsável por incentivar o desenvolvimento e reduzir desigualdades entre regiões.
— Incentivo econômico deixará de ser fiscal e passará a ser orçamentário. Esse fundo precisa ser robusto. Não é de curto prazo, pode ir aumentando, mas precisa ter fonte e precisa ter posição negociada com o governo. [Terá] uma regra constitucionalizada de como serão distribuídos os recursos do Fundo de Desenvolvimento Regional, que não deve ficar para a uma lei complementar.
Braga afirmou que o FDR deve ser política de estado e que ele espera no mínimo R$ 40 bilhões de montante. Para o relator, o FDR diminuirá a pressão de representantes do setor produtivo para entrarem em regime especial ou regime diferenciado. Segundo relatório do TCU entregue a Braga em setembro , as exceções às regras tributárias reduzem o impacto positivo da reforma.
A senadora Dorinha lembrou que já existem fundos semelhantes que, para ela, não cumprem sua função.
— Hoje temos os fundos regionais. A gente não abre mão, mas estão longe de responder para o que foi pensando. Não têm conseguido contribuir para o desenvolvimento [dos estados].
Segundo o texto atual da PEC, o FDR entregará recursos da União aos Estados e ao Distrito Federal para a elaboração de estudos, projetos e obras de infraestrutura, fomento a atividades produtivas e promoção ao desenvolvimento científico, tecnológico e à inovação.
Ante a possibilidade de redução na arrecadação de alguns estados, a Câmara dos Deputados incluiu trecho na PEC que permite criação de novos tributos estaduais em produtos primários e semielaborados, como agropecuários e mineração. Para Efraim, o texto deveria ser adaptado para vedar a criação de novas contribuições, permitindo o tributo apenas aos estados que já o possuem.
Apesar de o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, decidir pela tramitação da matéria unicamente na CCJ antes de ir ao Plenário, o presidente da CAE optou por contribuir com o debate. Na avaliação de Vanderlan, os especialistas convidados trouxeram informações inéditas.
De acordo com Braga, até o momento da reunião a CCJ já havia recebido 537 emendas. Ele também chamou a atenção para o curto prazo para a promulgação da PEC ainda neste ano. Para isso, disse, o relatório precisa ser apresentado na CCJ no máximo até 1º de novembro.
Para a senadora Tereza Cristina (PP-MS), não há problema em uma aprovação apenas em 2024, enquanto para o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) o Congresso Nacional deve aproveitar o momento.
— Nós passamos ao longo da história da Nova República por diferentes governos, todos eles falaram de reforma tributária. Mas em nenhum momento o Congresso teve ela tão pronta, tão perto de ser aprovada como agora.