Uma vacina contra meningite meningocócica apresentou alta proteção em bebês de até dois anos para os quatro tipos de bactérias mais comuns nessa faixa etária e que nunca haviam tido contato com o patógeno.
A vacina induziu a uma resposta imune similar à da fórmula já existente, conhecida como monovalente contra meningite causada por meningococo C, e apresentou ainda proteção elevada comparada à vacina quadrivalente também já em uso, que protege contra os tipos A, C, W e Y.
A meningite meningocócica provoca inflamação na meninge, membrana que envolve o sistema nervoso, incluindo o cérebro. Os sintomas em geral são inespecíficos e incluem fraqueza, febre, vômito e dor de cabeça. Em casos mais graves, pode levar a hospitalização e morte.
Os resultados do estudo clínico de fase 3 que avaliou a não inferioridade do imunizante em comparação aos outros dois foram publicados no último dia 21 na revista especializada Human Vaccines and Immunotherapeutics.
De acordo com a farmacêutica Sanofi, a vacina em estudo, chamada MenQuadfi (MenACWY-TT), é inovadora por induzir uma resposta imune superior ao tipo C do meningococo em comparação às outras fórmulas mono e tetravalente, da farmacêutica Pfizer. O meningococo C é o principal agente causador da doença meningocócica invasiva no Brasil (corresponde a cerca de 80% dos tipos de meningite meningocócica no país).
Além disso, o imunizante se mostrou seguro, sem a ocorrência de efeitos adversos graves.
Para avaliar a resposta imune da nova fórmula, os pesquisadores recrutaram 701 bebês de 12 a 23 meses, que não haviam recebido nenhuma vacina meningocócica prévia, em 29 centros distribuídos em Alemanha, Dinamarca e Finlândia.
Do total de bebês, 230 receberam a vacina MenQuadfi, 232 receberam a quadrivalente da Pfizer e 239 receberam a monovalente contra o tipo C. Amostras de sangue foram colhidas no primeiro dia antes da vacinação e 30 dias depois para avaliar anticorpos produzidos.
Segundo Isabelle Bertrand, vice-diretora de assuntos médicos de vacinas na Sanofi Europa, esse é o primeiro estudo que demonstrou uma vacina meningocócica quadrivalente tendo uma resposta imune superior em crianças não previamente imunizadas em comparação com uma vacina monovalente disponível.
"O meningococo C é atualmente o que mais causa meningite meningocócica no Brasil, porém um aumento significativo na incidência de meningite causada pelo tipo W, mais agressivo, também tem sido observado nos últimos dez anos. Dada a imprevisibilidade do tipo em circulação, é importante expandir ainda mais a proteção contra os quatro principais tipos [A, C, W e Y] da doença", disse.
Além disso, quando avaliadas três anos depois, 100% das crianças imunizadas com a MenQuadfi tinham ainda anticorpos –ante a marca de 6 em cada 10 alcançada com a vacina quadrivalente.
Na Europa, onde os estudos foram realizados, a vacina mais comumente em uso é a quadrivalente da Pfizer, mas essa mesma vacina possui menor proteção contra o tipo C. Recentemente, o Reino Unido e a Holanda tiveram surtos da doença por uma forma mais agressiva do meningococo C, cuja proteção na população era menor devido ao escape vacinal contra esse tipo.
Assim, os programas nacionais de imunização passaram a adotar a opção de imunização com a vacina monovalente C nos primeiros dois anos de vida e, depois, com a forma quadrivalente na adolescência.
Por aqui, o Programa Nacional de Imunização oferece a vacina monovalente C no calendário de rotina da criança, com três doses da versão conjugada ao três, cinco e 12 meses (reforço). A forma contra o meningococo B é ofertada para os bebês na rede privada. Já a forma quadrivalente é ofertada na rede pública para jovens de 11 e 12 anos desde 2020.
De acordo com a farmacêutica, a MedQuandfi já possui autorização para uso em crianças maiores de 12 meses no Brasil.
Segundo o pediatra Marco Aurélio Sáfadi, professor da Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo e presidente do departamento de infectologia da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), a nova vacina tem como vantagem uma resposta imune muito robusta e que se mostrou também mais duradoura nos estudos, o que pode indicar que ela terá uma eficácia maior em bebês de até dois anos quanto à proteção contra o tipo C.
"É provável que essa taxa mais alta de anticorpos se traduza em uma proteção mais duradoura, protegendo as crianças por mais tempo e contra as diferentes formas", disse.
Para ele, apesar de ser uma doença rara, com uma incidência na população de cerca de mil casos por ano (no período pré-pandemia), a meningite causa medo por poder evoluir para formas graves em poucas horas. Segundo o Ministério da Saúde, em 2022 já foram registrados 11 óbitos em crianças e jovens de zero a 19 anos. Em 2021, foram nove mortes no total e, em 2020, 51.
"Na maioria das vezes, ela acomete crianças saudáveis, sem nenhuma condição prévia, e pode evoluir para um quadro grave com internação e até risco de vida em poucas horas", diz. "Por isso, é muito importante manter uma taxa de cobertura vacinal elevada para proteger todas as crianças".
De acordo com o pediatra, as doenças de transmissão respiratória, como é o caso da meningite, tiveram uma redução na incidência durante a pandemia devido ao isolamento e pelo fato de as crianças terem ficado muitos meses sem frequentar as escolas. Agora, com o retorno, é possível ver uma recrudescência de casos, afirma.
"Vimos uma redução de cerca de dois terços dos casos que normalmente observávamos. Mas sem dúvida é preciso aumentar a proteção agora, principalmente daqueles que não foram vacinados nos dois últimos anos, para evitar novos surtos."