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Estado deve reparação a indígenas por violências da ditadura militar, afirmam debatedores
Participantes de audiência pública sobre as violências sofridas pelos povos indígenas durante a ditadura militar (1964-1985), realizada na terça-fe...
26/04/2023 11h45
Por: Redação Fonte: Agência Câmara de Notícias

Participantes de audiência pública sobre as violências sofridas pelos povos indígenas durante a ditadura militar (1964-1985), realizada na terça-feira (25) na Câmara dos Deputados, disseram que a principal fonte de violações é a falta de demarcação de seus territórios. Conforme ressaltaram os debatedores, até hoje não se conhece ao certo nem sequer quantos indígenas morreram ou desapareceram nesse período. Por isso, sugeriram a criação de uma comissão indígena da verdade. A medida já havia sido proposta pela Comissão Nacional da Verdade, em 2014.

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O integrante da Comissão de Justiça e Paz de São Paulo Marcelo Zelic ressaltou ser fundamental que essa nova comissão da verdade ouça todos os povos, a fim de produzir provas materiais das violações de direitos para embasarem processos judiciais por reparação. Ele acrescentou que os próprios arquivos oficiais estão repletos de provas documentais. 

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Representante do Povo Krenak na Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), Geovanni Krenak relatou várias formas de tortura sofridas por seu povo durante a ditadura. Entre elas: exílio, proibição de falar a língua materna e de se  casar com pessoas da mesma etnia e até a construção de um presídio em suas terras. E tudo isso, segundo Geovanni, foi relatado pelos próprios militares na Comissão da Verdade.

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“Meu avô, por exemplo, foi exilado, amarrado, colocado dentro de um vagão de trem da Vale e levado para a Fazenda Guarani (MG), onde faleceu no exílio, assim como outros parentes. Foi uma tática do governo de tentar exterminar o povo”, afirmou.

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De acordo com a conselheira da Comissão de Anistia Maíra Pankararu, Minas Gerais, onde se localiza o território Krenak, foi um laboratório de “práticas horrorosas” na ditadura. Além do reformatório, os militares criaram no estado a guarda indígena rural, “um experimento bizarro, que trabalhou indígenas para serem torturadores”, relatou.

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Joenia Wapichana: demarcação de terras é dever do Estado, não uma indenização - (Foto: Renato Araújo/Câmara dos Deputados)

Segundo Maíra Pankararu, a comissão da verdade chegou a mais de 8 mil indígenas mortos durante a ditadura militar, mas apontou que o colegiado não contou com uma estrutura própria para esse tema, e esse número se refere apenas aos dez povos estudados. O Brasil conta com 305 etnias indígenas.

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Dever do Estado
A presidente da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joenia Wapichana, destacou que as violências não ficaram no passado. Entre as violações atuais, citou a construção de hidrelétricas, como Belo Monte, e a instalação de linhas de transmissão em terras indígenas, que têm impactos continuados na vida dos povos afetados.

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Na opinião da ministra, demarcação de terras não pode ser considerada indenização, pois representa uma obrigação do poder público.

“Reconhecimento de terra é um dever do Estado, não tem de ser colocado no bojo de indenização, não. É uma obrigação constitucional e tem de ser feito de imediato, já está atrasado.”

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Marcelo Zelic lembrou que, em 1978, o Estado brasileiro estabeleceu que em cinco anos demarcaria todas as terras indígenas. Na opinião do representante da Comissão de Justiça e Paz, cabe indenização a esses povos pelo não cumprimento da promessa.

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Autora do pedido para realização do debate, a deputada Célia Xakriabá (Psol-MG) acrescentou que nesta semana os ataques aos Guarani-Kaiowas, no Mato Grosso do Sul, se aprofundaram. Ela reivindicou que a Câmara não se omita diante dessa violência, mas lembrou que no Parlamento também “se encontram o latifúndio, o agronegócio”.

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Marcelo Zenic defende comissão da verdade específica para indígenas - (Foto: Renato Araújo/Câmara dos Deputados)

A parlamentar salientou que está em análise na Câmara projeto que aplica a tese do marco temporal, segundo a qual só podem ser demarcadas as terras ocupadas pelos povos indígenas até a data da promulgação da Constituição, em 5 de outubro de 1988 (PL 490/07). O debate foi parar no Supremo Tribunal Federal (STF), que ainda não decidiu sobre o assunto.

Para Célia Xakriabá, esse projeto de lei “reproduz toda a violência da ditadura militar, que arrancou os povos indígenas de seus territórios”.

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A deputada, que preside a Comissão da Amazônia e dos Povos Originários e Tradicionais, informou que o colegiado realizará audiências nos territórios Krenak e Maxakali, em Minas Gerais, para escutar a população sobre violências da ditadura.