O conselheiro João Camilo Júnior, representante das empresas de imprensa escrita, também se preocupa com o timing da discussão e defende a aprovação de um projeto sobre o tema ainda neste ano.
Polêmicas
Participante do debate, a professora da Universidade de Brasília (UnB) Marisa von Bülow explicou que uma das dificuldades para se estabelecer regras é conceituar conteúdo jornalístico e estabelecer quem deve ser remunerado – se o jornalista ou a empresa. Além disso, outra polêmica é quem deve pagar e pelo quê – ou seja, o que deve ser objeto de remuneração. Uma questão, por exemplo, é se o jornalismo de entretenimento deve ser incluído na regra.
A professora foi responsável pelo estudo Remuneração do Jornalismo pelas Plataformas Digitais , lançado pelo Comitê Gestor da Internet no Brasil (CGI.br) no ano passado. Na análise, Marisa apontou algumas alternativas para a remuneração de conteúdo jornalístico. A primeira é o estabelecimento de um fundo público de apoio ao setor, financiado pelas empresas de tecnologia. A segunda é a negociação direta, ou seja, uma relação plataforma-imprensa. E a terceira é uma possível fusão das duas sugestões.
Segundo ela, outra dificuldade na discussão é a falta de transparência sobre os termos de acordos entre as empresas de jornalismo e as de tecnologia, feitos em outros países. A professora lembrou que alguns países já têm legislação sobre o tema, como a Austrália, o Canadá, os países da União Europeia e mais recentemente a Indonésia.
Crise na imprensa
O presidente da Associação Nacional de Jornais (ANJ), Marcelo Rech, disse que o jornalismo profissional está sendo devastado financeiramente e que sua própria existência corre riscos, com empresas fechando em todo o mundo. Ele salientou que as legislações existentes não estão sendo o suficiente para cessar a crise na imprensa.
Na Austrália, citou o dirigente, a empresa Meta, responsável pelo Facebook e pelo Instagram, anunciou que não vai mais participar das negociações com a imprensa, porque está desativando sua aba de notícias.
“Pode existir então um efeito rebote: as plataformas reduzirem ainda mais a visibilidade do jornalismo profissional só para se eximir de qualquer pagamento”, apontou.
Taxação
Na visão de Marcelo Rech, a lógica tem que ser outra, e a regra não deve levar em conta se a empresa de tecnologia usa ou não o conteúdo jornalístico. Para ele, as empresas de tecnologia produzem uma “poluição social”, e quem tem a capacidade de limpar essa poluição é o jornalismo profissional.
“Então, nada mais justo que os 'poluidores', usando ou não o conteúdo jornalístico, paguem uma parte da limpeza dessa poluição social”, sugeriu.
Rech defende a taxação das empresas de tecnologia, uma espécie de “taxa de limpeza da poluição social”. Ele propôs que sejam remuneradas empresas jornalísticas com pelo menos um ano de funcionamento, com editor responsável e endereço físico, além de preferencialmente ser parte de uma associação jornalística, como a ANJ.
Para ele, as plataformas de inteligência artificial também devem ser incluídas na taxação. De acordo com Rech, cerca de 1/3 dos conteúdos utilizados por essas plataformas são conteúdos jornalísticos que foram incluídos na base de dados da IA sem autorização.
Tributo para big techs
Representante da categoria dos jornalistas no CSS, Maria José Braga afirmou que, para os jornalistas, não há equiparação entre jornalismo e entretenimento e, portanto, existe clareza sobre o tipo de conteúdo que deve ser remunerado. Ela lembrou que a crise na imprensa também é gerada pela migração da publicidade para as grandes plataformas digitais e defende políticas públicas para conter a desorganização do mercado jornalístico.
Maria José endossa a proposta da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) de criação de uma Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (Cide) para as plataformas digitais, com recursos sendo direcionados a um fundo público, gerido publicamente com transparência, fomentando a diversidade e pluralidade do jornalismo. Para a conselheira, essa discussão deve ser feita imediatamente no Congresso.
Modelo híbrido
Para Francisco Britto Cruz, do centro de pesquisa InternetLab, nem o Conselho de Comunicação Social nem o legislador devem se apropriar de apenas uma solução para construir uma norma justa. “Determinados usos do jornalismo podem merecer uma negociação direta, enquanto outras partes do mercado precisam ser tratadas de outra forma”, observou. Essas formas podem incluir, como defendem as associações de jornalistas, a constituição de um fundo.
Para a negociação direta entre empresas de tecnologia e empresas jornalísticas, ele acredita ser fundamental a transparência sobre os acordos. Na opinião dele, isso deve ser estabelecido no âmbito do PL das Fake News: a obrigação de transparência das plataformas em relação a esses acordos. Conforme o pesquisador, a transparência auxilia as organizações jornalísticas menores a entender o processo de negociação das empresas maiores e para a sociedade compreender como estão sendo feitos esses acordos.
A reunião de hoje foi a segunda vez que o conselho discutiu o tema. A primeira ocorreu em agosto do ano passado, mas o grupo não conseguiu emitir um parecer sobre o assunto, razão pela qual promoveu uma nova audiência pública.
O Conselho
Previsto na Constituição Federal de 1988, o Conselho de Comunicação Social foi implementado oficialmente em 1991. É composto por 13 membros titulares e 13 suplentes , entre representantes do setor midiático e integrantes da sociedade civil.
Atua como órgão consultivo do Congresso Nacional e emite pareceres sobre assuntos relacionados à comunicação social.